Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
Simão IV, conde de Montfort, foi o segundo filho de Simão III e de Amícia, filha de Roberto de Beaumont, conde de Leicester, na Inglaterra. Nasceu aproximadamente em 1150.
Tendo sucedido a seu pai como barão de Montfort em 1181, casou-se em 1190 com Alice de Montmorency, de quem teve três filhos.
Em 1198 partiu para a Palestina com uma tropa de cavaleiros franceses, mas obtiveram poucos êxitos.
Em 1202 participou da IV Cruzada. Mas vendo que seus companheiros se desviavam do fim piedoso que os tinha movido, e tomaram de assalto Constantinopla, separou-se deles e foi para a Terra Santa, onde se cobriu de glória.
Alguns anos mais tarde, em 1209, aderiu à cruzada convocada pelo Papa Inocêncio III contra os albigenses, no sul da França.
Quem eram os albigenses
Tomando o seu nome da cidade de Albi, ao sul da França, centro da heresia, essa seita panteísta e maniqueísta pregava a existência de dois princípios (ou deuses) opostos, um bom e outro mau.
O bom era o criador do mundo espiritual, e o mau o do material.
Eram considerados males — frutos do princípio mau — os fenômenos naturais, como o crescimento dos homens, animais e plantas, e mesmo os fenômenos extraordinários, como terremotos; esse princípio mau era também responsável pelas desordens sociais, como a guerra.
Por isso a procriação era também um mal, porque perpetuava a matéria. Foram eles precursores dos atuais inimigos da vida, utilizando preservativos e práticas anti-natalistas.
Daí tiravam como conseqüência os maiores absurdos. O ideal para os mais perfeitos era aniquilar o corpo até atingir uma espécie de nirvana budista.
Para livrar-se da matéria pecaminosa, alguns chegavam a tais excessos, que procuravam a morte pela abstenção da comida e da bebida (endura), por sangramentos ou veneno, ou ainda fazendo-se degolar para não voltar a cair na classe dos impuros.
Segundo essa doutrina, Cristo, como era perfeito, só tinha espírito. Seu corpo material era apenas uma aparência. Com isso, conseqüentemente, negava-se sua paixão e morte real; negavam também a maternidade divina de Nossa Senhora e os Sacramentos.
Evidentemente, os albigenses eram contra a Igreja enquanto instituição e contra sua Hierarquia, e visavam sua extinção, como também a do Estado.
onstituíam uma seita “socialista, ou seja, anarquista”, contrária ao casamento e à propriedade privada, e mesmo contra a raça humana, ao pregar o suicídio.
Desejavam extinguir a Igreja e instalar um Estado onde só houvesse puros. O Papa Inocêncio III dizia que os albigenses eram piores que os sarracenos.
Quando os albigenses adquiriram força suficiente, com o auxílio de vários senhores da região, aos poucos começaram a atacar igrejas e mosteiros, a expulsar bispos de suas cidades e a ameaçar os fiéis.
A situação chegou a tal estado de calamidade, que uma testemunha ocular declara: “Vi igrejas incendiadas e destruídas até os alicerces, e vi os mosteiros transformados em habitação dos animais do campo”.
O grande São Bernardo, visitando aquela região, registra que encontrou “as igrejas sem povo, o povo sem sacerdotes, os cristãos sem Cristo”.
Tal seita teve um grande defensor no conde Raimundo VI, de Toulouse, que “levava uma vida licenciosa, havia-se casado cinco vezes e voltara a se separar de suas mulheres ao seu capricho; atribuíam-se a ele os lances mais licenciosos”. Outros senhores da região, que levavam vida igualmente licenciosa, favoreceram também a heresia.
Papa Inocêncio III procurou antes ganhar os hereges pela persuasão, enviando entre eles monges cartuxos como missionários. Mas os hereges não lhes deram ouvidos e continuaram em sua impiedade.
O Pontífice incitou então o conde de Toulouse a perseguir seus súditos hereges.
Raimundo VI fez jogo duplo, expulsando alguns deles, mas concorrendo para o assassinato do legado papal, Pedro de Castelnau (1208).
Inocêncio III então o excomungou, desligando seus súditos do juramento de fidelidade, e pregou uma cruzada contra os albigenses.
Entretanto, o rei da França, Felipe Augusto, suserano de Raimundo VI, e por isso mais diretamente responsável pela cruzada, não acorreu ao chamado do Papa por estar em guerra contra João Sem-Terra, da Inglaterra. Mas liberou seus vassalos para esse fim.
Uma multidão deles atendeu ao apelo pontifício, entre os quais o conde Simão de Montfort, que logo foi eleito capitão general da empresa.
Foi ele o homem talhado para tal, pois
“era da madeira de que se fazem os fundadores de Estados. Se bem que já com 60 anos de idade, era ainda um homem formoso, hábil, prudente, intrépido, de heróico valor, incansável, eloqüente, afável; soube inspirar em seus súditos uma fervorosa adesão, e exercia sobre seus inimigos uma forma de fascínio que os paralisava”.“Levanta-te e cinge-te da espada”
O Papa, temendo o desaparecimento da Igreja naquelas paragens, incentivou Simão a combater tenazmente os hereges:
“Eia, paladino de Cristo, o sangue dos justos clama a ti para que ponhas diante da Igreja o escudo da fé contra seus inimigos! levanta-te e cinge-te da espada”.Acusa-se de excessos a Simão de Montfort em sua campanha, mas tem-se que levar em conta os usos bárbaros que ainda persistiam de algum modo naquele século.
Sobretudo é necessário ressaltar que a crueldade dos albigenses em seus ataques às igrejas e mosteiros, seu ódio à Religião católica e seu fanatismo religioso causavam justa indignação no ânimo de seus adversários católicos.
Ademais, aquela guerra adquirira ainda o caráter de uma guerra de civilizações,
“pelo ódio que dividia então as duas raças – os franceses do norte e os franceses do sul – tão diferentes pela sua língua, costumes e grau de civilização”.
Se não fosse o valor e a energia de Simão de Montfort, provavelmente a heresia albigense teria dominado não só o sul da França, mas teria se estabelecido na Itália e outros países europeus.
Em 1213 Simão derrotou o Rei Pedro de Aragão, genro de Raimundo, na batalha de Muret.
Os albigenses foram então esmagados, mas Simão continuou a guerra como uma guerra de conquista, sendo indicado, pelo Conselho de Montpellier, senhor de todos os recém- conquistados territórios, como Conde de Toulouse e Duque de Narbonne (1215).
O Papa confirmou essa indicação, entendendo que ele efetivamente completaria a supressão da heresia.
Mas não era o fim da guerra. Em 1218 Raimundo voltou da Espanha, para onde fugira. Com a ajuda de seu sobrinho Jaime I, de Aragão, formara poderoso exército, e com ele cercou Toulouse.
Simão de Montfort estava assistindo à Missa quando lhe foram dar a notícia.
Era antes da Consagração. Respondeu ele: “Não vou enquanto não tiver visto meu Salvador”.
E quando o sacerdote elevava a Hóstia, ele estendeu as mãos ao céu e exclamou: “Senhor, deixa que teu servo morra em paz, se é tua vontade”.
Logo montou a cavalo e correu para o lugar da luta, quando viu seu irmão Guido de Montfort caindo do cavalo, ferido por uma seta.
Morte de Simão de Montfort |
À morte do intrépido comandante, os cruzados retiraram-se para um acampamento fortificado, enquanto na cidade os rebeldes, de alegria, fizeram tocar a repique os sinos de todas as igrejas.
Dos três filhos do heróico comandante, o mais velho, Amaury, herdou suas possessões francesas; e o caçula, com o mesmo nome que o pai, sucedeu-o como barão de Leicester, desempenhando um importante papel na história da Inglaterra.
Amaury, filho de Simão, estava longe de ter o valor do pai. Tanto ele quanto Raimundo VII, que também sucedera ao pai, cederam seus direitos sobre o território ao rei da França.
O Concílio de Toulouse, em 1229, confiou a vigilância religiosa do território à Inquisição. Mais tarde, em 1233, esta passou aos dominicanos.
Mas a perniciosa heresia só iria desaparecer no fim do século XIV.
Entretanto, Simão de Montfort lhe havia dado o golpe mortal.
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