quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Clóvis, Rei dos francos, instrumento da Providência Divina

Clovis I, representado no "Reccueil des rois de France". Du Tillet,1550
Clóvis I, representado no "Recueil des rois de France". Du Tillet,1550
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs




Dentre as hordas de bárbaros que investiram contra as possessões romanas do Ocidente na Europa central, destacaram-se os francos, povo guerreiro e valente.

Ora unindo-se às tropas imperiais, ora combatendo-as, tornaram-se tão poderosos, que a filha de um de seus reis, Eudóxia, veio a casar-se com o Imperador Arcádio.

Com a queda do Império Romano em 476, os francos dominaram o norte da Gália; os godos, o sul; os burguinhões, as duas margens do Ródano, restando ainda, entre os rios Sena e Loire, remanescentes do Império sob o governo de Siágrio.

Um dos grandes chefes francos foi Childerico I (458-481), que se casou com Basina da Turíngia.

Tiveram um filho são e robusto a quem deram o nome de Clóvis. Estava ele destinado a mudar o curso da história da Gália (França) e, por conseguinte, da Europa.

Clóvis subiu ao trono franco ainda adolescente, e com uma maturidade precoce fez suas primeiras conquistas. "Sagacidade na deliberação e ousadia na execução distinguiram sobretudo este soberano"1.

Conforme já tinha feito seu pai, Clóvis, apesar de pagão, manteve cordiais relações com os bispos da Gália. Quando subiu ao trono, recebeu amistosa carta de São Remígio, arcebispo de Reims.

Cheio de vitalidade no ardor de sua juventude, para satisfazer o ânimo belicoso de seus súditos Clóvis partiu para a conquista de novas terras, começando por derrotar Siágrio.

Este se refugiou junto a Alarico, rei dos visigodos. Clóvis intimou Alarico a entregar o fugitivo e o executou, apoderando-se de seu reino. Estabeleceu então Soissons como sua capital.

É dessa época o fato legendário que aparece em todas as biografias do grande guerreiro. Após a batalha, os francos haviam tomado como despojo de guerra, entre outras preciosidades da igreja de São Remígio, um belíssimo vaso.

Batismo de Clovis por São Remígio, Reims
Batismo de Clóvis por São Remígio. Estátuas em Reims, junto da igreja de São Remígio
O arcebispo pediu a Clóvis, que muito o respeitava, que o devolvesse. O rei prometeu fazê-lo. E foi a Soissons, onde seriam divididos os despojos.

Pediu a seus guerreiros que, além da parte que lhe cabia como rei, lhe dessem também o vaso, para devolvê-lo a São Remígio.

Todos concordaram, menos um que, de mau humor, disse ao rei: "Tu não terás senão o que te couber por direito". E, como bárbaro que era, atingiu o vaso com sua acha.

O rei, embora indignado, não disse nada. Um ano depois, seus soldados apresentaram-se armados diante dele; quando chegou em frente do soldado insolente, Clóvis derrubou-lhe a acha das mãos e desferiu-lhe tremendo golpe na cabeça, dizendo: "Foi assim que trataste o vaso de Soissons"

Como bom estadista, o rei franco usou de muita compreensão para com os povos conquistados, tratando do mesmo modo os galo-romanos e os francos, escolhendo entre ambos seus conselheiros, respeitando as leis locais, não tomando suas propriedades.

Tomou para si e seus guerreiros somente as que pertenciam ao Imperador ou ao Estado. Com isso, foi bem recebido por essas populações e firmou seu poderio sobre suas conquistas.

Clóvis recebeu do Imperador de Constantinopla o título de patrício, de cônsul e de ilustris, o que mais confirmou sua autoridade aos olhos dos povos conquistados.

O conhecido historiador belga Godofredo Kurth sintetizou de modo feliz a missão providencial e histórica do rei franco:

O batismo de Clóvis. Maestro de Saint Gilles
O batismo de Clóvis. Maestro de Saint Gilles
"Como estadista, conseguiu o que não alcançou nem o gênio de Teodorico, o Grande, nem o de nenhum dos reis bárbaros seus contemporâneos: sobre as ruínas do Império Romano, construiu um poderoso sistema, cuja influência dominou a civilização europeia durante muitos séculos"2.

Batismo de Clóvis: consequências transcendentais

"O batismo de Clóvis teve consequências incalculáveis para os destino da Igreja e da França. Clóvis, católico, foi considerado desde então como o chefe do catolicismo. Santo Avito, bispo de Vienne e primaz das igrejas da Borgonha, apressou-se em felicitá-lo: `Vossa adesão à fé é nossa vitória; todas as vezes que vós combaterdes, seremos nós que triunfaremos'"3.

O reino de Clóvis tornou-se, na época, o primeiro Estado católico em meio a reinos pagãos ou arianos do Ocidente, e ocupava o território que correspondia aproximadamente ao da França de hoje. Em vista disso, essa nação recebeu o glorioso título de Filha Primogênita da Igreja4.

Clóvis prestou grande serviço à Igreja Católica, combatendo o arianismo. Assim, no ano 500, numa guerra fratricida no reino da Borgonha, aliou-se a um dos irmãos arianos e, unidos, venceram as tropas do outro que, para salvar-se, prometeu pagar um tributo anual ao rei franco.

Assim os dois reis burguinhões tornaram-se tributários do monarca franco. Com isso cessaram as pressões sobre os católicos daquele reino.

Clóvis I em batalha contra os visigodos. Iluminura de manuscrito na Biblioteca Nacional da Holanda
Clóvis I em batalha contra os visigodos.
Iluminura de manuscrito na Biblioteca Nacional da Holanda
Mais tarde Clóvis venceu os visigodos da Aquitânia, também arianos, onde era ansiosamente esperado pelos católicos locais, duramente perseguidos.

Ele foi encorajado nessa empresa pelo Imperador bizantino Anastácio. Os francos tomaram posse do reino visigótico até os Pirineus e o rio Rhone.

Ao norte da Gália, o rei dos francos foi se assenhorando, nem sempre por métodos lícitos, dos outros reinos francos que existiam ao lado do seu. Como Clóvis era aparentado a esses reis, foi em parte por direito de sucessão, em parte por aclamação popular, que ele se tornou soberano único de quase toda a Gália.

O papel da Igreja na formação do reino franco

Tornando-se senhor de um grande reino, Clóvis mudou sua capital para Paris. Administrava suas várias províncias através de condes, seus representantes, e formou uma aristocracia composta de francos e galo-romanos. Ordenou que fosse posta por escrito a Lei Sálica.

"Foi sobretudo graças à sua conduta em relação à Igreja que Clóvis pôde estender tão facilmente seu poder sobre a Gália. Mesmo antes de sua conversão, ele mantinha relações com São Remígio e Santa Genoveva; e em seguida encontra-se perto dele São Avito, enquanto mantém relações com os bispos católicos dos reinos arianos"5.

Clovis I, gissant em Saint Denis, Paris Túmulo de Clóvis, Saint-Denis
Túmulo de Clóvis, na abadia de Saint-Denis, Paris
Clóvis faleceu repentinamente com 45 anos de idade, tendo sido sepultado na cripta da igreja de Santa Genoveva, que ele havia construído.

Lá permaneceu seu sarcófago até que os revolucionários, durante a Revolução Francesa, o quebraram e espalharam suas cinzas, destruindo também o belo santuário.

O rei franco deixou a seus quatro filhos um reino que antes não fora senão retalhos esparsos.

Estava assentada a base da futura França, onde se reunira "a cultura romana e seu dom de organização, o ardor e a mobilidade dos célticos, a força e profundidade germânicas"6 .

Notas:
1.Juan Bautista Weiss, Historia Universal, Tipografia La Educación, Barcelona, 1927, tomo IV, p. 378.
2.Godefroid Kurth, in The Catholic Encyclopedia, Robert Appleton Company, 1908, Online Edition by Kevin Knight, verbete Clovis.
3.Pe. A. Boulenger, Histoire de l'Église, Librairie Catholique Emmanuel Vitte, Paris, 1925, p. 157.
4."A nobilíssima nação francesa [...] tendo abraçado o Cristianismo pela iniciativa de seu Rei, Clóvis, foi galardoada com o mais honrável testemunho de sua fé e piedade com o título de `filha primogênita da Igreja". (Papa Leão XIII, Carta Encíclica "Nobilissima Gallorum Gens", sobre as questões religiosas na França, promulgada a 8 de fevereiro de 1884).
5.C. Bayet, La Grande Encyclopédie, Société Anonyme de la Grande Encyclopédie, Paris, tomo XI, verbete Clovis, p. 720.
6.Juan Bautista Weiss, op. cit., p. 392.



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9 comentários:

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  2. adorei
    mesmo que esteja um pouco encompleto a história dele é ótima
    bjs e abraços a todos

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  3. adoooooooooooooooooooooooro
    ameiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii

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  4. Muito bom,Me ajudou bastante ;)

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  5. De forma simples, sucinta mas elegante, disse "tudo que eu precisava saber" sobre a origem do povo francês!
    Parabéns!!!

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  6. Eu gosto muito de conhecer a história da humanidade.E, admiro muito de como o ser humano é, e, até hoje nós continuamos a fazer coisas acreditando que somos os tai´s. Mal pensamos que apenas estaremos aqui por um pequeno tempo. tudo passa.................

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