terça-feira, 21 de setembro de 2021

“El Cid Campeador”: herói que marcou Espanha para sempre

Monumento a El Cid, Burgos
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs




A Espanha produziu um mundo de personagens capazes de inspirar os homens cultos, o que é mais do que produzir cultura, como é mais produzir História do que produzir historiadores.

Dentre esses heróis sobressai a figura histórica ‒ com sua projeção mítica, psicológica e religiosa ‒ de Rodrigo (Ruy) Diaz de Vivar, “El Cid Campeador”. (Cid = do árabe ‘Senhor’)

O “Cid Campeador” apareceu num momento decisivo da História espanhola.

Boa parte da Espanha estava invadida por muçulmanos vindos da África do Norte.

E o país estava dividido entre os que queriam se acomodar com os invasores, incluso do ponto de vista religioso, e os que queriam resistir defendendo a ortodoxia católica.

No norte da África houve grandes civilizações como a dos egípcios e dos cartagineses.

O Egito foi mais ou menos assumido pelo Império Romano do Oriente. Cartago passou a ser uma colônia do Império Romano do Ocidente. Santo Agostinho nasceu em Cartago, nesse período.

El Cid, Valladolid
O cristianismo espalhou-se por toda essa zona, inclusive pelo Egito, que se tornou todo ele católico.

Quando os muçulmanos vieram para dominar, encontraram uma massa despersonalizada que não era nada.

E aquelas antigas e veneráveis civilizações sumiram da História, e não se sabe que fim levaram...

As cristandades que povoaram o norte da África foram engolidas pelo Islã porque antes mesmo de chegarem os islâmicos tinham virado conjuntos de povos-ninguém.

Eles foram levados para onde o invasor quis, porque estavam completamente vazios de mentalidade.

Da mesma maneira, quando os muçulmanos invadiram a Espanha, eles encontraram duas Espanhas:

‒ a Espanha que logo virou a dos mozárabes ‒ amálgama inglória e heterodoxa entre Cristandade e Islã ‒ que lentamente foi se habituando ao domínio islâmico e iria se reduzir a nada;

‒ a Espanha do Cid, que caminhava para a reação.

Se tivesse prevalecido a Espanha dos mozárabes, a Espanha teria desaparecido. Porém como a tendência Cid prevaleceu, então houve a Espanha de São Fernando e tudo o que veio depois.


continua no próximo post: “El Cid Campeador” homem-símbolo dos heróis espanhóis







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terça-feira, 7 de setembro de 2021

O herói português e Nossa Senhora: afinidade profunda

O milagre
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
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A origem da devoção a Nossa Senhora de Nazaré se prende a um fato ocorrido por volta do ano de 1150 em Portugal.

“Estando um jovem e vistoso cavalheiro português Dom Fuas Roupinho à caça de um veado entre intensa neblina vê-se subitamente no alto de um rochedo à beira-mar, e se seu cavalo não houvesse estancado, ter-se-ia precipitado ao mar.

“Cheio de terror e considerando o perigo, agradeceu ao Senhor de toda alma a sua salvação. Mas o perigo não passara de todo, pois o cavalo não podia avançar nem recuar sem precipitar-se no abismo.

“Procurando uma saída, nota o cavaleiro uma imagem de Nossa Senhora numa caverna do rochedo. E cheio de fé, lança-se aos seus pés implorando socorro.

“Ao tomar a imagem nas mãos nota um pequeno pergaminho preso a ela que narra ter sido venerada essa imagem já em Nazaré, há muito tempo - portanto em Nazaré da Palestina.

“Com a perseguição do Imperador de Constantinopla ao culto das imagens, foi ela trazida à Espanha por um monge, e ali fora muito venerada até que no século VII, com a invasão dos mouros foi ali escondida pelos fiéis, para não ser profanada.

“Cheio de fé e confiança na Virgem, monta novamente o intrépido cavaleiro a sua montaria, esporeando-a violentamente, consegue fazê-la dar um grande salto que atinge um ponto do qual lhe foi fácil descer.

Local do milagre
“Cheio de gratidão à Virgem, mandou construir no local uma pequena capela, sendo depois substituída por magnífico templo".

Trata-se de um fato cheio de evocações graciosas.

Um dos heróis de independência de Portugal, um cavalheiro católico, D. Fuas Roupinho, está caçando um veado no meio de névoa e de repente chega à beira-mar montando em seu cavalo.

O mar que ruge, as neblinas, e o cavalheiro meio atordoado, de repente fica face ao abismo e não sabe como voltar, mas reza a Nossa Senhora e vem esta graça.

A caverna também tem seu encanto.

Imaginem uma caverna à beira-mar onde há uma imagem abandonada, quiçá para ser protegida contra a sanha dos sarracenos, depois de já ter sido refugiada da sanha dos maometanos e dos cismáticos da Ásia Menor.

Santuário de Nossa Senhora de Nazaré, Portugal
Os séculos se passam, os mares fazem todos seus movimentos e a imagem sozinha ali. É uma coisa linda essa solidão da imagem em face do mar.

Mas depois, o desígnio da Providência: utilizar essa imagem para um reflorescimento do culto de Nossa Senhora.

Então nesse episódio, D. Fuas Roupinho recebe graças insignes que lhe indicam que Nossa Senhora quer que ali o culto a Ela refloresça.

Fixa-se o culto, ele manda construir a capelinha.

Mas as graças concedidas por Nossa Senhora aos fiéis ali são tantas, que em lugar de uma capelinha, dentro em breve está um magnífico mosteiro.

Nossa Senhora de Nazaré, Belém do Pará, Brasil
É a invocação de Nossa Senhora de Nazaré que se irradia por toda Cristandade.

O Estado do Pará, e mais especialmente a cidade de Belém do Pará, tem como padroeira Nossa Senhora de Nazaré.

Aqui há mais uma vez a afirmação do princípio residuum revertetur, quer dizer o resto voltará. A imagem foi completamente abandonada e voltou...

Ela fugiu, foi perseguida duas vezes. E em cada uma das duas vezes houve um reflorescimento da devoção a Ela.

Com isso se mostra que a Providência pode permitir que alguma coisa boa chegue ao ponto de sua extinção, porque Ela a prepara para voltar novamente a uma grande glória.

Aí vemos a inesgotável misericórdia de Nossa Senhora.

Mas também outro princípio: quando a gente está mal, quando a gente está num desastre, a gente deve fazer o possível para salvar tudo o que há de bom, porque depois isto vai ser semente para uma nova vitória e uma nova ressurreição.



(Autor: Plinio Corrêa de Oliveira, 22/05/67. Sem revisão do autor).


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terça-feira, 24 de agosto de 2021

Foulques Nerra “cujos remorsos estavam à altura de seus crimes”

Castelo de Missillac
Castelo de Missillac
Luis Dufaur
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Há uma diferença fundamental entre o homem moderno e o homem medieval.

Não podemos nos iludir: os homens da Idade Média eram homens como nós, concebidos no pecado, que tinham que fazer muito esforço para se vencerem a si próprios e serem bons.

E houve medievais ruins, pecadores, criminosos ou heréticos, além de bons, virtuosos, campeões da lei e da fé.

Eles também encontravam um contexto social e econômico muito conturbado. Mas de um modo diverso: a civilização e a ordem romana haviam ruído estrepitosamente. Não havia ordem no início da era medieval. Tudo era caos e confusão.

E essa desordem geral era propícia a toda espécie de crimes e abusos que, de fato, aconteciam.

Castelo de Montsoreau, Pays de la Loire
Castelo de Montsoreau, Pays de la Loire
A diferença estava em que o medieval tinha também um coração amante e um enlevo de criança pela pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Enquanto o bandido moderno – e muitas vezes o não-bandido moderno – ostentam uma frieza assustadora, inumana até, diante do crime ostensivo ou dissimulado, o medieval chorava sincera e profundamente seus pecados.

Vejamos o caso de Foulques Nerra (965/970-1040), duque de Anjou. Ele foi um homem muito característico dos primeiros séculos medievais.

Ele foi um personagem de temperamento violento e de uma energia pouco comum. Nele ainda fervia o sangue dos bárbaros não há muito batizados.

Passou para a história como “um dos batalhadores mais agitados da Idade Média”, segundo o historiador Achille Luchaire.

Fazendo jus ao não remoto sangue bárbaro, Foulques foi cruel. Porém, depois de suas más ações, sua consciência falava. E aqui encontramos uma diferença com o bandido moderno.

Foulques tinha um coração amante e um enlevo de criança pela pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo que lhe fazia sentir o mal moral e a ofensa a Deus de suas más ações. Ele era um homem muito sensível ao bem e ao mal.

Por isso ele sentia remorsos e fazia sinceras penitências. Já foi escrito que “seus remorsos estavam à altura de seus crimes”.

Quarto num castelo do vale do Loire
Quarto num castelo do vale do Loire
Hoje os turistas fazem muito bem em visitar o famoso vale do Loire, na França, cheio de castelos maravilhosos.

Sabem eles que na origem dessa  proliferação magnífica de castelos e também de abadias, estava um grande pecador e um grande penitente: Foulques Nerra?

Entre castelos para suas guerras e abadias para purgar suas ofensas a Deus, ele construiu assim cerca de cem prédios históricos.

Talvez Foulques seja o personagem a quem o vale do Loire mais deve castelos e abadias.

Mais. Peregrinou três vezes à Terra Santa (em 1002, 1006 e 1038), em reparação pelas suas más ações.

Em sua última romaria a Jerusalém, dirigiu-se com o dorso nu até o Santo Sepulcro, enquanto dois de seus servidores, por ordem sua, flagelavam-no e bradavam: “Senhor, recebei o péssimo Foulques, conde d’Anjou, que Te traiu e renegou. Olha para sua alma arrependida, ó Senhor Jesus!”

Após inúmeras guerras, ereção de castelos e abadias, Foulques se extinguiu na paz de Deus na cidade de Metz, na França, voltando da romaria penitencial da Terra Santa que acabamos de mencionar.

A bênção da penitência bem feita ainda perfuma o famosíssimo vale do Loire.




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terça-feira, 10 de agosto de 2021

São João Fisher: lampejos heroicos da Igreja até quando é traída por todos

São João Fisher, vitral dos Santos Mártires, catedral Santa Maria, Sheffield
São João Fisher, vitral dos Santos Mártires, catedral Santa Maria, Sheffield
Luis Dufaur
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São João Fisher foi bispo de Rochester e Cardeal, que o rei apóstata Henrique VIII Tudor mandou degolar em ódio à fé católica e ao primado do Romano Pontífice, no século XVI.

São João Fisher foi companheiro de martírio de São Tomás Moro, mas seu mérito é tanto mais louvável quanto ele estava inteiramente isolado.

Na Igreja da Inglaterra houve uma defecção geral e um dos aspectos mais pavorosos da protestantização do reino foi a indolência e a facilidade com que a massa dos católicos passou para o protestantismo.

Por um interesse político, de conveniência pessoal e de carreira, esses ou aqueles eclesiásticos mudaram infamemente de religião.

Sem dramas de consciência nem nada, o que prova que toda a estrutura religiosa da Inglaterra estava podre.

Essa podridão vinha desde o tempo do mártir São Tomás Becket.

O movimento que ele liderou foi derrotado e a igreja inglesa ficou nas mãos do rei da Inglaterra.

Santo Tomás Moro e São João Fisher, mártires do protestantismo
Santo Tomás Moro e São João Fisher, mártires do protestantismo
Passou a ser uma seita protestante, os atuais anglicanos, que após breve crise previa por comodismo se colocou nas mãos temporais.

Ela tinha feito um pacto com as molezas e vantagens do mundo, que a deixou prestes a aceitar a temporalização e a laicização.

Tomou uma atitude pré-revolucionária, inteiramente infestada do espírito revolucionário.

Quando veio Henrique VIII e fez o cisma contra o Papa, a igreja inglesa caiu preparada por uma longa putrefação prévia.

Excetuaram-se alguns mártires num número maior do que se costuma dizer.

Não foram apenas São Tomás Moro e São João Fisher, mas houve mártires como, por exemplo, os cartuxos decapitados por ordem do rei.

Mas, assim mesmo, o número de mártires não mudou a história.

Dessas noções, a gente depreende alguns ensinamentos.

O primeiro é: como as sucessivas traições vêm de longe preparando as grandes catástrofes.

Medeiam séculos entre São Tomás Becket e Henrique VIII e, entretanto, naquele tempo já começou a putrefação.

Martírio de São João Fischer
A hierarquia eclesiástica e a nobreza que era toda católica foi calando inteira. Quando chegou a tentação, eles se deixaram arrastar por completo.

Segundo: é uma coisa parecida com a situação contemporânea da Igreja.

Porque antes de aparecer o liturgicismo e o progressismo, houve um emboloramento do elemento católico pela inércia em face da Revolução Francesa.

A adesão sem “arrière pensée” às formas democráticas cheias do espírito de Rousseau; a adesão à separação entre a Igreja e o Estado; a aceitação preguiçosa e míope da atmosfera moderna que invadia a sociedade.

Então, a atonia, a indiferença doutrinária, a simpatia para com toda espécie de erro, foi criando uma combustibilidade que pegaria fogo logo que aparecesse a primeira chama do progressismo.

Então, a massa do movimento católico imerge, hoje também, num erro novo e tremendo.

Esse erro operou pelas concessões uma mudança da religião no movimento católico w preparou por meio de concessões.

A história se repete: os grandes processos de atonia e tibieza, de perda da dedicação e da militância católicos, de indiferentismo, preparam a massa católica para fazer as maiores defecções.

São João Fischer, vitral em Harvington
São João Fisher, vitral em Harvington
Terceiro: ao lado disto, há a santidade que permanece na Igreja.

Apesar de todas estas tristezas, ficam os mártires; homens de um caráter admirável, que preferem tudo a ceder diante do adversário.

Eles expõem a própria vida e tudo quanto têm para se manter fiéis à verdadeira tradição e à continuidade eclesiástica.

Quer dizer, até quando a putrefação invade os meios católicos, a santidade da Igreja produz frutos, em verdade excepcionais, mas tão maravilhosos como não se encontram fora da Igreja.

Então a Igreja, ao mesmo tempo em que é traída, renegada, deita uns lampejos que provam a divindade dEla.

É uma afirmação contínua da assistência do Divino Espírito Santo.

Este é um dos melhores exemplos do martírio de São João Fisher.



(Autor: excertos de palestra de Plinio Corrêa de Oliveira em 28-05-1969. Apud PlinioCorreadeOliveira.info).