quarta-feira, 21 de maio de 2014

Um país “talhado à espada” – D. Afonso Henriques 3

Continuação do post anterior


A batalha de Ourique, cuja importância para o nascimento de Portugal é inegável, ainda hoje é alvo de disputas.

É verdade que os detalhes se perderam nas brumas do passado; mas os efeitos da batalha não fizeram senão confirmar o plano da Providência Divina: formou-se um povo soberano, marcado a fundo em sua personalidade pela fé verdadeira, povo que tomou a peito o ideal da propagação dessa mesma fé até os confins da Terra.

E Nossa Senhora, aparecendo em solo português nos albores do século XX, ao profetizar os castigos, afirmou, entretanto, que “em Portugal se conservaria sempre o dogma da Fé”.(2)


Batalha de Ourique

Comandando seus homens nos campos de Ourique — situados quer no Baixo Alentejo, quer no Cartaxo, cerca de Santarém, quer junto às nascentes do Liz, próximo a Leiria, a discussão é grande a tal respeito (3) — e certo da vitória, garantida por Nosso Senhor, D. Afonso Henriques dá batalha à multidão de mouros que cercavam seu exército.


Não fosse a promessa recebida, teria sido temerária a empresa: as narrativas falam na proporção de cem muçulmanos para cada cristão.

Tal era o desejo de vingança do rei Ismar, o maior entre os cinco reis mouros reunidos e o comandante supremo das tropas muçulmanas, que, para engrossá-las, chegara a incluir mulheres disfarçadas na cavalaria, fato que depois foi constatado.

Estimulados pela bravura demonstrada desde o início por D. Afonso, os portugueses avançam invocando São Tiago, e com o brado “Real, real! Por Afonso, Rei de Portugal!”, selam assim, como o próprio Cristo afirmara a D. Afonso, sua escolha como rei.

Os feitos de valentia multiplicam-se de ambos os lados e figuras de destaque dos dois exércitos tombam por terra. Estando já avançada a tarde, D. Afonso divisa o coração do inimigo:

“El Rei D. Afonso entendendo como a principal força dos contrários consistia em hum esquadrão muy forte, que servia de guarda a el Rey Ismário, em o qual vinha por Capitão hum seu sobrinho por nome Homar Atagor, homem de incredíveis forças, se resolveu em rematar contas, e juntos a si os mais fortes de seu campo o investiu com tanto valor, e bom sucesso, que mortos os principais delle com seu Capitão, se começou a desordenar o exército dos Árabes. Vendo el Rey Ismário o perigo que corria sua vida, sem poder remediar a ruína de seu Campo, se pôs em fugida”.(5)

Vencida a batalha, D. Afonso Henriques permanece ainda durante três dias com sua gente naquele campo, seguindo o costume da Cavalaria medieval, para certificar-se da desistência do inimigo. E a fim de cumprir a ordem de Cristo crucificado:

“Para que teus descendentes conheçam quem lhes dá o reino, comporás o escudo de tuas armas do preço com que eu remi o gênero humano, e daquele por que fui comprado dos judeus”(6), manda em seguida que se desenhe no seu brasão de armas cinco escudos — recordando as cinco chagas de Nosso Senhor — cada qual com cinco moedas, simbolizando os trinta dinheiros pelos quais fora vendido o Salvador aos seus algozes.

Camões assim imortaliza a vitória em Os Lusíadas:

Já fica vencedor o Lusitano,
Recolhendo os troféus e presa rica;
Desbaratado e roto o Mauro Hispano,
Três dias o grão Rei no campo fica.
Aqui pinta no branco escudo ufano,
Que agora esta vitória certifica,
Cinco escudos azuis esclarecidos,
Em sinal destes cinco Reis vencidos.(7)

“El Rei” D. Afonso

D. Afonso sai vitorioso, e aclamado por seu povo como rei. Entretanto, muito tempo ainda transcorrerá até que os outros povos o reconheçam. Desde logo, D. Afonso dirige-se ao Papa para prestar-lhe vassalagem, com a carta Clavis regni coelestis(13-12-1143).(8)

Na carta Devotionem tuam, de 1º-5-1144, o Papa Lúcio II agradece efusivamente a D. Afonso, cujos propósitos louva, mas chama-lhe, em vez de rex, apenas dux (não rei, mas duque).

É só mais tarde, em 1179, que recebe a bula Manifestis probatum, do Papa Alexandre III, reconhecendo-lhe finalmente o título de Rei (AMEAL, pp. 69-71).

continua no post seguinte

(Autor: Guilherme Félix de Sousa Martins, CATOLICISMO, fevereiro 2013.



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Um comentário:

  1. Eu deveria ter estudado História e me especializado em Historia antiga ou medieval adoro. Obrigada por me deixarem informada.

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